E quem quiser contribuir, mandando inclusive textos, é só me contactar. Comentários, é claro, serão bem-vindos - quem quiser polemizar, discutir, brigar, também pode: só não prometo continuar no tema, pois o tempo nem sempre existe, nem tudo vale a pena mergulhar fundo e os assuntos são muitos.

Ah! Para quem não me conhece, posso me definir como um ATIVISTA CULTURAL BRASILEIRO – adotando definição dada pela jornalista Beatriz Wagner (obrigado, Bea!) durante o Brazil Film Festival de Sydney, em outubro de 2009. Sou de São Paulo, capital, mas moro em Sydney, Austrália desde o final de 1980. Além de ser ou gostar de ser um ativista cultural, ou como parte disso, faço música, cinema, escrevo, trabalho como guia de turismo multilíngüe (em português, inglês, espanhol e italiano) viajando por toda a Austrália, faço traduções, dou aulas de violão, português e inglês, entre outras coisas – e sou formado em Arquitetura e Urbanismo pelo Mackenzie (SP) sem ter exercido a profissão.

domingo, outubro 24, 2010

A TORTURA QUE MORA AO NOSSO LADO



texto de José Aparecido Miguel no Jornal do Brasil, 15/10/2010

Quase uma semana depois, não me saem da cabeça as imagens e os depoimentos do filme “Perdão, Mister Fiel”, sobre a tortura e a morte do metalúrgico Manoel Fiel Filho, em janeiro de 1976, durante o governo do general Ernesto Geisel, no período da ditadura militar no Brasil (1964-1985).

“Perdão, Mister Fiel” é um documentário do jornalista, escritor e cineasta Jorge Oliveira, que teve pré-estreia no Memorial da Resistência, domingo, em São Paulo. O Memorial da Resistência ocupa o antigo prédio do Departamento Estadual de Ordem Política e Social (DEOPS), onde Manoel Fiel Filho foi torturado e morto, a exemplo de, meses antes, Vladimir Herzog, sacrifícios humanos que impulsionaram uma mudança política no país, rumo à democracia que hoje vivemos. DEOPS, aliás, também foi conhecido como DOPS (sem referência ao E de estadual).

O filme, um longa-metragem de 90 minutos, mostra a influência dos Estados Unidos na manutenção das ditaduras da época na América Latina, e traz o depoimento do ex-agente do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna), Marival Chaves, que revela minuciosamente como eram mortos e esquartejados os presos no DOPS, comandado pelo delegado Sérgio Fleury, e no DOI-CODI. Para lembrar, o DOI-CODI era um órgão de “inteligência” e repressão subordinado ao Exército brasileiro.

“Perdão, Mister Fiel”, na minha opinião, pode ser a mola propulsora da retomada de debate que leve ao julgamento bandidos-torturadores, travestidos de agentes de segurança, e sobre a prática de tortura na atualidade. As cenas do filme colocam em questão a Lei da Anistia.

Depois do filme, ao lado do ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, Audálio Dantas, o cineasta Jorge Oliveira lembrou a importância do combate, também, à tortura que acontece diariamente nas cadeias e distritos policiais do país.

Audálio Dantas, que teve destacada participação na resistência à ditadura, especialmente no período do assassinato de Vladimir Herzog, comentou que o brasileiro vive a ameaça de sofrer tortura todos os dias, a partir, por exemplo, de um simples acidente de trânsito, de um simples desentendimento verbal com um policial.

No filme, o irmão do presidente Lula, Frei Chico, José Ferreira da Silva, também torturado pela ditadura, toca no mesmo tema.

Estranhamente, pelo que soube, até hoje nenhuma autoridade do governo foi ouvir o ex-agente do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna), Marival Chaves, que pediu demissão de sua função em 1985, e vive no Espírito Santo, embora o documentário já seja público e tenha oito prêmios em festivais de cinema, como o de Brasília. (Depois de ter postado este comentário, li no Jornal do Brasil que o secretário de Direitos Humanos do governo Lula, Paulo Vannuchi, disse que cabe ao Judiciário analisar o caso.)

O depoimento do ex-agente - "analista de informações" - dá nomes de responsáveis pela tortura na época, que incluiu barbaramente aplicação de injeção, para matar cavalos, em ativistas políticos.

O filme é revelador. O hoje ministro da Comunicação Social do governo Lula, Franklin Martins, estava marcado para morrer. Desviou-se dos torturadores nas ruas de São Paulo.

Na pré-estreia em São Paulo, Audálio Dantas propôs - e o auditório aceitou, por unanimidade - que “Perdão, Mister Fiel” receba o prêmio “hors concours” Vladimir Herzog de Direitos Humanos, que será entregue dia 25 de outubro.

A apresentação do filme, no Memorial da Resistência, fez parte do encerramento da exposição do brilhante designer gráfico Elifas Andreato, autor de centenas de capas de jornais e revistas com o tema da ditadura militar.

Diga não à tortura, onde ela ocorra.

segunda-feira, outubro 11, 2010

ESTAMOS DE OLHO NO BRASIL

QUE TAL UMA BOA POLÊMICA? DILMA OU SERRA?


A INTENÇÃO DESTE BLOG É TAMBÉM RECEBER CONTRIBUIÇÕES E FAZER UMA BOA DISCUSSÃO DOS TEMAS QUE MOBILIZAM AS PESSOAS.
EM ÉPOCA DE ELEIÇÃO, É CLARO QUE HÁ MUITO O QUE DISCUTIR.
MEU AMIGO SHIGUEO WATANABE JR, COM QUEM ESTUDEI NO JÁ FAMOSO "GINÁSIO VOCACIONAL OSWALDO ARANHA" EM SÃO PAULO (EVENTUALMENTE FECHADO PELA DITADURA MILITAR AINDA NO FINAL DOS ANOS 60) ME ESCREVEU UM EMAIL QUE SE ENCAIXA PERFEITAMENTE NESSA PERSPECTIVA DE DEBATE E POLÊMICA. CLARO QUE NÃO CONCORDO COM VÁRIAS COISAS QUE SHIGUEO ESCREVEU, MAS ACHO O EMAIL EXCELENTE E, INCLUSIVE, UMA PERSPECTIVA INTERESSANTE DE QUEM NÃO SE ENCAIXA COMO SEGUIDOR OU DEFENSOR DE NINGUÉM.
SHIGUEO ME DEU A PERMISSÃO DE PUBLICÁ-LO AQUI ABAIXO:


O Paulo,


Fiquei todo animado quando recebi email seu anunciando seu blog.

Mas foi só entrar e topar com o texto sobre a “Marina você se pintou?” que desanimei.

E em seguida vem os textos do Boff e do Frei Betto.



A visão de que o PT representa a vitória na luta de classes cansou.

Depois destes 8 anos, o projeto do Lula e do PT é só um – se manter no poder a qualquer custo.

Uma das primeiras reações de alguém da executiva na segunda-feira, depois de terem mapeado o impacto do tema do aborto no primeiro turno, foi de virar o estomago. Era simplesmente tirar o tema do programa do partido. E acrescentava com o comentário de que o programa tinha um peso muito grande das feministas e que ele nunca havia concordado com tudo aquilo.

Ora, tenha paciência! Programa de partido é a explicitação de sua razão de ser. Não é texto de blog que o cara apaga porque pegou mal.

Se a lógica deste sujeito funcionar, ele ganha os votos dos religiosos. Mas será que mantém os votos de toda a gente que apoiou o movimento feminista e que ainda quer discutir seriamente as desigualdades entre sexos?

Ontem estava conversando com amigos.

Se você der um recuo de historiador e quiser ler estes últimos 16 anos, provavelmente não achará tanta diferença assim entre os governos FHC e Lula.

Nenhum dos dois investiu pesado, de modo a modificar perenemente a saúde e a educação.

Nenhum dos dois tentou modernizar a legislação trabalhista – responsável por termos um mercado informal de 18% da PEA.

Nenhum dos dois tentou de fato fazer uma reforma política que favorecesse o surgimento de partidos políticos reais – e não este balcão de negócios que é o Congresso. Itens como voto distrital, extinção do Senado e tais – nem pensar.

O que se chama aqui de agribusiness – esta nova elite rural – foi altamente paparicado e protegido pelos dois.

Veja quem foram os Ministros da Agricultura do Lula – certamente não foi alguém do MST.

Os dois estabilizaram a economia – o que não é pouco. Mesmo diante da recessão mundial, graças aos negócios que temos com a China (vender minério de ferro e importar o aço deles – estratégia mais familiar, não, suprir o mundo de commodities e comprar produto acabado...), a economia não balançou muito não.



Talvez no quesito privatizações eles divirjam mais em espírito do que na prática – acho o Serra tão estatizante quanto a Dilma.


Nem o Lula nem o FHC gostou das críticas e do bombardeio da mídia.

A mídia, que hoje é a vilã a serviço das classes dominantes, que ataca injustamente o governo, denunciou um monte de coisas durante o governo FHC.

Gente do círculo dele (Mendonça de Barros, André Lara Rezende e outros) tiveram que sair por conta de escândalos.

Ministros foram pegos andando de avião oficial e tiveram que devolver dinheiro para o Tesouro.

A filha dele teve que deixar um cargo por conta da pressão da mídia.



Então não me venha com esta polarização emocional.

Como se o Serra tivesse saído ontem do comando do DOPS e o Fernando Henrique tivesse sido pego com um monte de escravos no seu sítio em Ibiúna. E que no PT só tem almas puras e revolucionárias.



Finalmente este texto sobre a Marina.

Ela declarou hoje que tem laços fortes com pessoas no PT. Principalmente com o Lula.

Pelo que ele representou, pelo que o PT representou na vida dela.

Agora, reduzir o que ela passou a “percalços e dificuldades que você teve no Governo Lula” é muito, mas muito desonesto.

O Lula nunca se importou com a sustentabilidade do país ou do planeta.

Convidou a Marina para o governo e teve dificuldades em tirá-la por conta da reputação internacional dela.

Alguém já te contou como é que a Dilma tratava ela?

A moça foi escorraçada pelo próprio Lula e agora vem todo mundo com beijinhos?

Torço para que ela se declare neutra que seria a única maneira de podermos trabalhar para abrir outros caminhos políticos aqui.

E tem que começar construindo uma oposição de fato (sim, acho que a Dilma ganha) e aproveitar o fato de que uma geração se foi (FHC, Tasso Gereissati, Marco Maciel, Quércia). Fico tentado a aposentar o próprio Serra.


Em suma, amigo (sim, espero sinceramente que o que nos une seja mais forte do que uma eleição), não vou seguir a parte política do teu blog. Vou ver o que pinta sobre cultura e Corinthians que é o que nos une e intriga.


Um grande e saudoso abraço,

Shigueo

sábado, outubro 09, 2010

Marina... você se pintou?



“Marina, morena Marina, você se pintou” – diz a canção de Caymmi. Mas é provável, Marina, que pintaram você. Era a candidata ideal: mulher, militante, ecológica e socialmente comprometida com o “grito da Terra e o grito dos pobres”, como diz Leonardo.

Dizem que escolheu o partido errado. Pode ser. Mas, por outro lado, o que é certo neste confuso tempo de partidos gelatinosos, de alianças surreais e de pragmatismo hiperbólico? Quem pode atirar a primeira pedra no que diz respeito a escolhas partidárias?

Mas ainda assim, Marina, sua candidatura estava fadada a não decolar. Não pela causa que defende, não pela grandeza de sua figura. Mas pelo fato de que as verdadeiras causas que afetam a população do Brasil não interessam aos financiadores de campanha, às elites e aos seus meios de comunicação. A batalha não era para ser sua. Era de Dilma contra Serra. Do governo Lula contra o governo do PSDB/DEM. Assim decidiram as “famiglias” que controlam a informação no país. E elas não só decidiram quem iria duelar, mas também quiseram definir o vencedor. O Estadão dixit: Serra deve ser eleito.

Mas a estratégia de reconduzir ao poder a velha aliança PSDB/DEM estava fazendo água. O povo insistia em confirmar não a sua preferência por Dilma, mas seu apreço pelo Lula. O que, é claro, se revertia em intenção de voto em sua candidata. Mas “os filhos das trevas são mais espertos do que os filhos da luz”. Sacaram da manga um ás escondido . Usar a Marina como trampolim para levar o tucano para o segundo turno e ganhar tempo para a guerra suja.

Marina, você, cujo coração é vermelho e verde, foi pintada de azul. “Azul tucano”. Deram-lhe o espaço que sua causa nunca teve, que sua luta junto aos seringueiros e contra as elites rurais jamais alcançaria nos grandes meios de comunicação. A Globo nunca esteve ao seu lado. A Veja, a Folha de São Paulo, o Estadão jamais se preocuparam com a ecologia profunda. Eles sempre foram, e ainda são, seus e nossos inimigos viscerais.

Mas a estratégia deu certo. Serra foi para o segundo turno, e a mídia não cansa de propagar a “vitória da Marina ”. Não aceite esse presente de grego. Hão de descartá-la assim que você falar qual é exatamente a sua luta e contra quem ela se dirige.

“Marina, você faça tudo, mas faça o favor”: não deixe que a pintem de azul tucano. Sua história não permite isso. E não deixe que seus eleitores se iludam acreditando que você está mais perto de Serra do que de Dilma. Que não pensem que sua luta pode torná-la neutra ou que pensem que para você “tanto faz”. Que os percalços e dificuldades que você teve no Governo Lula não a façam esquecer os 8 anos de FHC e os 500 anos de domínio absoluto da Casa Grande no país cuja maioria vive na Senzala. Não deixe que pintem “esse rosto que o povo gosta, que gosta e é só dele”.

Dilma, admitamos, não é a candidata de nossos sonhos. Mas Serra o é de nossos mais terríveis pesadelos. Ajude-nos a enfrentá-lo. Você não precisa dos paparicos da elite brasileira e de seus meios de comunicação. “Marina, você já é bonita com o que Deus lhe deu”.

Maurício Abdalla - Professor de filosofia da UFES, autor de Iara e a Arca da Filosofia (Mercuryo Jovem), dentre outros.

quinta-feira, setembro 30, 2010

Carta ao Povo: Juristas lançam manifesto defendendo governo Lula


Está aqui abaixo uma demonstracão clara do que significa atualmente no Brasil a existência de uma mídia golpista, determinada a atacar desesperadamente o governo Lula, não importando de que maneira - inclusive através de mentiras e apelos velados a um novo golpe militar (como já fizeram em 1964, aliás). O desespero dessa mídia é tamanho que acusam o governo Lula de autoritarismo - gesto de uma ironia atroz, pois quem justamente é uma ameaça à democracia é essa mesma grande mídia - pois odeiam e são incapazes de aceitar o fato de que o governo Lula tem 80% de popularidade, melhorou a vida de grande parte dos marginalizados do país (que seguirão votando no PT) e vencerá esta eleição que se aproxima.
Está aqui abaixo a resposta a essas acusações mentirosas, através de um manifesto assinado por vários juristas de renome.




Um grupo de renomados juristas divulgou nesta segunda-feira (27/09/2010) manifesto intitulado "Carta ao Povo Brasileiro", onde reafirmam o compromisso do governo Lula com a preservação e a consolidação da democracia no pais. Os juristas rebatem a tese do "autoritarismo e de ameaça à democracia" que setores da grande imprensa e a oposição vêm tentando imputar ao presidente Lula e ao seu governo, após o presidente ter feito críticas ao comportamento da mídia em relação à candidatura de Dilma Rousseff.

"Nos últimos anos, com vigor, a liberdade de manifestação de idéias fluiu no País. Não houve um ato sequer do governo que limitasse a expressão do pensamento em sua plenitude. Não se pode cunhar de autoritário um governo por fazer criticas a setores da imprensa ou a seus adversários, já que a própria crítica é direito de qualquer cidadão, inclusive do Presidente da República", diz um trecho do documento, assinado por dezenas de personalidades do mundo jurídico, incluindo vários presidentes estaduais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O documento registra ainda que é preciso deixar o povo ""tomar a decisão dentro de um processo eleitoral legítimo, dentro de um civilizado embate de idéias, sem desqualificações açodadas e superficiais, e com a participação de todos os brasileiros".

Veja abaixo a íntegra do manifesto:

Em uma democracia, todo poder emana do povo, que o exerce diretamente ou pela mediação de seus representantes eleitos por um processo eleitoral justo e representativo. Em uma democracia, a manifestação do pensamento é livre. Em uma democracia as decisões populares são preservadas por instituições republicanas e isentas como o Judiciário, o Ministério Público, a imprensa livre, os movimentos populares, as organizações da sociedade civil, os sindicatos, dentre outras.

Estes valores democráticos, consagrados na Constituição da República de 1988, foram preservados e consolidados pelo atual governo.

Governo que jamais transigiu com o autoritarismo. Governo que não se deixou seduzir pela popularidade a ponto de macular as instituições democráticas. Governo cujo Presidente deixa seu cargo com 80% de aprovação popular sem tentar alterar casuisticamente a Constituição para buscar um novo mandato. Governo que sempre escolheu para Chefe do Ministério Público Federal o primeiro de uma lista tríplice elaborada pela categoria e não alguém de seu convívio ou conveniência. Governo que estruturou a polícia federal, a Defensoria Pública, que apoiou a criação do Conselho Nacional de Justiça e a ampliação da democratização das instituições judiciais.

Nos últimos anos, com vigor, a liberdade de manifestação de idéias fluiu no País. Não houve um ato sequer do governo que limitasse a expressão do pensamento em sua plenitude.

Não se pode cunhar de autoritário um governo por fazer criticas a setores da imprensa ou a seus adversários, já que a própria crítica é direito de qualquer cidadão, inclusive do Presidente da República.

Estamos às vésperas das eleições para Presidente da República, dentre outros cargos. Eleições que concretizam os preceitos da democracia, sendo salutar que o processo eleitoral conte com a participação de todos.

Mas é lamentável que se queira negar ao Presidente da República o direito de, como cidadão, opinar, apoiar, manifestar-se sobre as próximas eleições. O direito de expressão é sagrado para todos – imprensa, oposição, e qualquer cidadão. O Presidente da República, como qualquer cidadão, possui o direito de participar do processo político-eleitoral e, igualmente como qualquer cidadão, encontra-se submetido à jurisdição eleitoral. Não se vêem atentados à Constituição, tampouco às instituições, que exercem com liberdade a plenitude de suas atribuições.

Como disse Goffredo em sua célebre Carta: “Ao povo é que compete tomar a decisão política fundamental, que irá determinar os lineamentos da paisagem jurídica que se deseja viver”. Deixemos, pois, o povo tomar a decisão dentro de um processo eleitoral legítimo, dentro de um civilizado embate de idéias, sem desqualificações açodadas e superficiais, e com a participação de todos os brasileiros.


ADRIANO PILATTI - Professor da PUC-Rio

AIRTON SEELAENDER - Professor da UFSC

ALESSANDRO OCTAVIANI - Professor da USP

ALEXANDRE DA MAIA - Professor da UFPE

ALYSSON LEANDRO MASCARO - Professor da USP

ARTUR STAMFORD - Professor da UFPE

CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO - Professor Emérito da PUC-SP

CEZAR BRITTO - Advogado e ex-Presidente do Conselho Federal da OAB

CELSO SANCHEZ VILARDI - Advogado

CLÁUDIO PEREIRA DE SOUZA NETO - Advogado, Conselheiro Federal da OAB e
Professor da UFF

DALMO DE ABREU DALLARI - Professor Emérito da USP

DAVI DE PAIVA COSTA TANGERINO - Professor da UFRJ

DIOGO R. COUTINHO - Professor da USP

ENZO BELLO - Professor da UFF

FÁBIO LEITE - Professor da PUC-Rio

FELIPE SANTA CRUZ - Advogado e Presidente da CAARJ

FERNANDO FACURY SCAFF - Professor da UFPA e da USP

FLÁVIO CROCCE CAETANO - Professor da PUC-SP

FRANCISCO GUIMARAENS - Professor da PUC-Rio

GILBERTO BERCOVICI - Professor Titular da USP

GISELE CITTADINO - Professora da PUC-Rio

GUSTAVO FERREIRA SANTOS - Professor da UFPE e da Universidade Católica de Pernambuco

GUSTAVO JUST - Professor da UFPE

HENRIQUE MAUES - Advogado e ex-Presidente do IAB

HOMERO JUNGER MAFRA - Advogado e Presidente da OAB-ES

IGOR TAMASAUSKAS - Advogado

JARBAS VASCONCELOS - Advogado e Presidente da OAB-PA

JAYME BENVENUTO - Professor e Diretor do Centro de Ciências Jurídicas da
Universidade Católica de Pernambuco

JOÃO MAURÍCIO ADEODATO - Professor Titular da UFPE

JOÃO PAULO ALLAIN TEIXEIRA - Professor da UFPE e da Universidade Católica de Pernambuco

JOSÉ DIOGO BASTOS NETO - Advogado e ex-Presidente da Associação dos
Advogados de São Paulo

JOSÉ FRANCISCO SIQUEIRA NETO - Professor Titular do Mackenzie

LENIO LUIZ STRECK - Professor Titular da UNISINOS

LUCIANA GRASSANO - Professora e Diretora da Faculdade de Direito da UFPE

LUÍS FERNANDO MASSONETTO - Professor da USP

LUÍS GUILHERME VIEIRA - Advogado

LUIZ ARMANDO BADIN - Advogado, Doutor pela USP e ex-Secretário de Assuntos
Legislativos do Ministério da Justiça

LUIZ EDSON FACHIN - Professor Titular da UFPR

MARCELLO OLIVEIRA - Professor da PUC-Rio

MARCELO CATTONI - Professor da UFMG

MARCELO LABANCA - Professor da Universidade Católica de Pernambuco

MÁRCIA NINA BERNARDES - Professora da PUC-Rio

MARCIO THOMAZ BASTOS - Advogado

MARCIO VASCONCELLOS DINIZ - Professor e Vice-Diretor da Faculdade de
Direito da UFC

MARCOS CHIAPARINI - Advogado

MARIO DE ANDRADE MACIEIRA - Advogado e Presidente da OAB-MA

MÁRIO G. SCHAPIRO - Mestre e Doutor pela USP e Professor Universitário

MARTONIO MONT'ALVERNE BARRETO LIMA - Procurador-Geral do Município de
Fortaleza e Professor da UNIFOR

MILTON JORDÃO - Advogado e Conselheiro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

NEWTON DE MENEZES ALBUQUERQUE - Professor da UFC e da UNIFOR

PAULO DE MENEZES ALBUQUERQUE - Professor da UFC e da UNIFOR

PIERPAOLO CRUZ BOTTINI - Professor da USP

RAYMUNDO JULIANO FEITOSA - Professor da UFPE

REGINA COELI SOARES - Professora da PUC-Rio

RICARDO MARCELO FONSECA - Professor e Diretor da Faculdade de Direito da
UFPR

RICARDO PEREIRA LIRA - Professor Emérito da UERJ

ROBERTO CALDAS - Advogado

ROGÉRIO FAVRETO - ex-Secretário da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça

RONALDO CRAMER - Professor da PUC-Rio

SERGIO RENAULT - Advogado e ex-Secretário da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça

SÉRGIO SALOMÃO SHECAIRA - Professor Titular da USP

THULA RAFAELLA PIRES - Professora da PUC-Rio

WADIH NEMER DAMOUS FILHO - Advogado e Presidente da OAB-RJ

WALBER MOURA AGRA - Professor da Universidade Católica de Pernambuco

sábado, setembro 25, 2010

CONSOLIDAR A RUPTURA HISTÓRICA OPERADA PELO PT – texto de Leonardo Boff* publicado em 30/08/2010


Para mim o significado maior desta eleição é consolidar a ruptura que Lula e o PT instauraram na história política brasileira. Derrotaram as elites econômico-financeiras e seu braço ideológico, a grande imprensa comercial. Notoriamente, elas sempre mantiveram o povo à margem da cidadania, feito, na dura linguagem de nosso maior historiador mulato, Capistrano de Abreu, "capado e recapado, sangrado e ressangrado". Elas estiveram montadas no poder por quase 500 anos. Organizaram o Estado de tal forma que seus privilégios ficassem sempre salvaguardados. Por isso, segundo dados do Banco Mundial, são aquelas que, proporcionalmente, mais acumulam no mundo e se contam, política e socialmente, entre as mais atrasadas e insensíveis. São vinte mil famílias que, mais ou menos, controlam 46% de toda a riqueza nacional, sendo que 1% delas possui 44% de todas as terras. Não admira que estejamos entre os países mais desiguais do mundo, o que equivale dizer, um dos mais injustos e perversos do planeta.

Até a vitória de um filho da pobreza, Lula, a casa grande e a senzala constituíam os gonzos que sustentavam o mundo social das elites. A casa grande não permitia que a senzala descobrisse que a riqueza das elites fora construída com seu trabalho superexplorado, com seu sangue e suas vidas, feitas carvão no processo produtivo. Com alianças espertas, embaralhavam diferentemente as cartas para manter sempre o mesmo jogo e, gozadores, repetiam: "façamos nós a revolução antes que o povo a faça". E a revolução consistia em mudar um pouco para ficar tudo como antes. Destarte, abortavam a emergência de outro sujeito histórico de poder, capaz de ocupar a cena e inaugurar um tempo moderno e menos excludente. Entretanto, contra sua vontade, irromperam redes de movimentos sociais de resistência e de autonomia. Esse poder social se canalizou em poder político até conquistar o poder de Estado.

Escândalo dos escândalos para as mentes súcubas e alinhadas aos poderes mundiais: um operário, sobrevivente da grande tribulação, representante da cultura popular, um não educado academicamente na escola dos faraós, chegar ao poder central e devolver ao povo o sentimento de dignidade, de força histórica e de ser sujeito de uma democracia republicana, onde "a coisa pública", o social, a vida lascada do povo ganhasse centralidade. Na linha de Gandhi, Lula anunciou: "não vim para administrar, vim para cuidar; empresa eu administro, um povo vivo e sofrido eu cuido". Linguagem inaudita e instauradora de um novo tempo na política brasileira. O "Fome Zero", depois o "Bolsa Família", o "Crédito Consignado", o "Luz para Todos", o "Minha Casa, minha Vida, o "Agricultura familiar, o "Prouni", as "Escolas Profissionais", entre outras iniciativas sociais permitiram que a sociedade dos lascados conhecesse o que nunca as elites econômico-financeiras lhes permitiram: um salto de qualidade. Milhões passaram da miséria sofrida à pobreza digna e laboriosa e da pobreza para a classe média. Toda sociedade se mobilizou para melhor.

Mas essa derrota infligida às elites excludentes e anti-povo, deve ser consolidada nesta eleição por uma vitória convincente para que se configure um "não retorno definitivo" e elas percam a vergonha de se sentirem povo brasileiro assim como é e não como gostariam que fosse. Terminou o longo amanhecer.

Houve três olhares sobre o Brasil. Primeiro, foi visto a partir da praia: os índios assistindo a invasão de suas terras. Segundo, foi visto a partir das caravelas: os portugueses "descobrindo/encobrindo" o Brasil. O terceiro, o Brasil ousou ver-se a si mesmo e aí começou a invenção de uma república mestiça étnica e culturalmente que hoje somos. O Brasil enfrentou ainda quatro duras invasões: a colonização que dizimou os indígenas e introduziu a escravidão; a vinda dos povos novos, os emigrantes europeus que substituíram índios e escravos; a industrialização conservadora de substituição dos anos 30 do século passado mas que criou um vigoroso mercado interno e, por fim, a globalização econômico-financeira, inserindo-nos como sócios menores.

Face a esta história tortuosa, o Brasil se mostrou resiliente, quer dizer, enfrentou estas visões e intromissões, conseguindo dar a volta por cima e aprender de suas desgraças. Agora está colhendo os frutos.

Urge derrotar aquelas forças reacionárias que se escondem atrás do candidato da oposição. Não julgo a pessoa, coisa de Deus, mas o que representa como ator social. Celso Furtado, nosso melhor pensador em economia, morreu deixando uma advertência, título de seu livro A construção interrompida (1993): "Trata-se de saber se temos um futuro como nação que conta no devir humano. Ou se prevalecerão as forças que se empenham em interromper o nosso processo histórico de formação de um Estado-Nação" (p.35). Estas não podem prevalecer. Temos condições de completar a construção do Brasil, derrotando-as com Lula e as forças que realizarão o sonho de Celso Furtado e o nosso.

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* Teólogo, filósofo e escritor [Autor de Depois de 500 anos: que Brasil queremos, Vozes (2000)].

SINAIS DOS TEMPOS - texto de Frei Betto* PUBLICADO EM 19/09/2010

O mercado é o novo fetiche religioso da sociedade em que vivemos. Antigamente, nossos avós consultavam a Bíblia, a palavra de Deus, diante dos fatos da vida. Nossos pais, o serviço de meteorologia: "Será que vai chover?". Hoje, consulta-se o mercado: "O dólar desvalorizou? Subiu a Bolsa? Como oscilou o mercado de capitais?".

Diante de uma catástrofe, de um acontecimento inesperado, dizem os comentaristas econômicos: "Vamos ver como o mercado reage". Fico imaginando um senhor, Mr. Mercado, trancado em seu castelo e gritando pelo celular: "Não gostei da fala do ministro, estou irado." Na mesma hora os telejornais destacam: "O mercado não reagiu bem frente ao discurso ministerial".

Para as agências de publicidade, o mercado no Brasil compreende cerca de 40 milhões de consumidores. Neste país de 190 milhões de habitantes, uma minoria tem acesso aos bens supérfluos. Os demais, só aos de necessidade indispensável.

O grande desafio das pessoas em idade produtiva, hoje, é como se inserir no mercado. Devem ser competitivas, ter qualificação, disputar espaços. Sabem que o sistema recomenda não levarem a sério conotações éticas e encarar como quimérico um planejamento de inclusão das maiorias. O mercado é, agora, internacional, globalizado; move-se segundo suas próprias regras, e não de acordo com as necessidades humanas.

A crise da modernidade é, portanto, também a do racionalismo. No início da modernidade, principalmente na época dos iluministas, a religião era considerada superstição. Camponeses da Idade Média regavam seus campos com água benta, agradeciam aos padres (que, diga-se de passagem, cobravam pela água benta) e depois louvavam a Deus pela boa colheita. Até o dia em que apareceu um senhor oferecendo a eles um pozinho preto, o adubo, que também custava dinheiro, mas não dependia da ira ou do agrado divino - bastava aplicá-lo à terra e aquilo facilitava a colheita.

O adubo funcionou melhor que a água benta! Muitos camponeses perderam a fé, porque a concepção de Deus predominante na Idade Média era a de um Ser utilitário. (Por isso se costuma dizer, em teologia, que Deus não é nem supérfluo nem necessário; é gratuito, como todo amor).

Outrora, falava-se em produção; quem tinha um capital, precisava investi-lo, produzir. Hoje, fala-se em especulação. Dinheiro produz dinheiro. A cada dia, através de computadores, bilhões de dólares rodam o planeta em busca de melhores lucros. Passam da Bolsa de Singapura para a de Tóquio, desta para a de Buenos Aires, desta para a de São Paulo, desta para a de Nova York, e assim por diante. Agora, em Singapura, provavelmente estarão discutindo o que fazer com US$ 6 bilhões disponíveis no mercado.

Outrora, falava-se em marginalização. Alguém marginalizado no emprego ainda tinha esperança de voltar ao centro. Hoje, marginalização cedeu lugar a outro termo, exclusão - o ser humano excluído não tem esperança de volta, porque o neoliberalismo é intrinsecamente excludente. A exclusão não é um problema para ele, tal como a marginalização era para o liberalismo: é parte da lógica de crescimento do sistema e da acumulação de riquezas.

Antes, falava-se em Estado, o importante era fortalecer o Estado. Um ministro da ditadura militar chegou a declarar: "Vamos fazer crescer o bolo, depois haveremos de dividi-lo." Só que o bolo cresceu, e o gato comeu, não se viu o resultado. Aqueles mesmos políticos que advogavam o crescimento do Estado defendem, hoje, a sua destruição, com o sofisticado lema da ‘privatização’.

Não sou radicalmente contrário à privatização, nem estatista. Há países ricos - como a França e o Reino Unido - nos quais os serviços públicos estatais funcionam muito bem. Não é por serem públicas que as empresas e os serviços devem operar negativamente. A história é outra: muitos políticos, que deveriam ser homens públicos, estão prioritariamente ligados a empresas privadas, de maneira que não têm interesse em que as coisas públicas, estatais, funcionem bem. O maior exemplo disso é o serviço de saúde no Brasil. São US$ 8 bilhões circulando por ano nos planos privados de saúde, que atendem apenas 30 milhões de pessoas numa população de 190 milhões. Por que o SUS haveria de funcionar bem? Outrora, alguém ficava doente e dava graças a Deus por conseguir um lugar no hospital. Hoje, as pessoas morrem de medo de ir para o hospital. Hospital virou ante-sala de cemitério.

A privatização não é só econômica, é também filosófica, metafísica. Tem reflexos na nossa subjetividade. Também nos tornamos seres cada vez mais privatizados, menos solidários, menos interessados nas causas coletivas e menos mobilizáveis para as grandes questões. A privatização invade até mesmo o espaço da religião: proliferam as crenças ‘privatizantes’, que têm conexão direta com Deus. Isso é ótimo para quem considera que o próximo incomoda. É a privatização da fé, destituindo-a da sua dimensão social e política.

Enfim, hoje se fala em globalização; ótimo que o planeta tenha se transformado numa aldeia. O que preocupa é constatar que esse modelo é, de fato, a imposição ao planeta do paradigma anglo-saxônico. Melhor chamá-lo de globocolonização!

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*Frei Betto é escritor, autor de "Hotel Brasil – o mistério das cabeças degoladas" (Rocco), entre outros livros.